“O retorno é o movimento do Caminho”




“O retorno é o movimento do Caminho”

Wu Jyh Cherng



O “retorno” é uma palavra que pode conter três significados;

-          em seu sentido bem linear: voltar para trás
-          movimento através do círculo.  O movimento é feito de retorno - porque estamos sempre voltando ao mesmo ponto.  E estamos sempre voltando ao mesmo ponto de todos os pontos desse círculo.  Assim, a palavra ‘retorno’ tem o sentido de movimento circular.
-          Movimento cíclico.  Depois da primavera, vêm o verão, o outono, o inverno e este último dá lugar à primavera, novamente.


Em seu primeiro sentido, o de voltar ao princípio, é como a palavra ‘reliquio’, ou  religião, voltar à origem, buscar a raízes e a essência primordial de todas as coisas. Isso é religião.

Não devemos, entretanto, confundir religião com igreja.  Igreja é a comunidade de pessoas que estão buscando esse retorno.  E cada religião obviamente interpreta esse ‘retorno’ de uma maneira ou de outra.  Por isso, existem diversos tipos de retorno, diversos caminhos para o retorno.

Podemos assim conhecer o retorno em seu sentido linear de ‘voltar ao princípio’, encontrar a origem das coisas.


Retorno também significa movimento em círculo.


E, finalmente, significa movimento em ciclos, em períodos cíclicos.


Sem dúvida, a primavera de um ano não é a primavera do ano anterior e não será a primavera do ano a seguir.

Assim, nunca se volta ao mesmo ponto.  Volta-se sim, à mesma natureza.

Dessa maneira, o ciclo acontece dentro do linear movimento da infinitude.


No Taoísmo, o conceito do tempo é infinito.  O passado não tem princípio.  O futuro não tem fim.  Não existe início dos tempos nem existe o fim dos tempos.

O tempo é um fio infinito.

E nessa infinitude, os ciclos se repetem.  Apenas que a primavera nunca é a mesma, mas tem sempre a mesma natureza.
Se conseguirmos saltar fóra desse fio de infinitude, veremos que - já que o fio é infinito, o tempo não existe para ele.  O tempo existe no fio, mas não existe a partir do momento que não existem nem início nem fim.  Todos os tempos na verdade estarão espalhados e estarão num mesmo tempo.

Essa é a compreensão da infinitude, segundo o Taoísmo.  Esse conceito é essencial dentro da teologia taoísta.  Ele difere essencialmente do conceito de outras religiões que falam do início, durante e fim dos tempos.
Para o Taoísmo, não existem nem fim nem início dos tempos.  O início está em todos os momentos.

O início, o durante e o fim são uma grande ilusão.


Na questão da re-encarnação, se existe o início, o durante e o fim (e são inúmeros os inícios, os durantes e os fins, um atrás do outro, encadeados) - olhando de fora uma vida após outra vida, veremos que a pessoa é sempre a mesma.

No entanto, se o tempo é infinito, a pessoa está sempre no mesmo tempo.  Assim, se eu estou   vivo hoje, a minha próxima vida já co-existe simultaneamente com essa minha vida, como também co-existe com a vida anterior a essa encarnação.  Tudo, neste momento, junto.

O que então acontece?

Para quem está fora desse fio de infinitude chamado ‘vida’, todos os tempos estão no mesmo  tempo.

Para quem está dentro desse fio, cada tempo é um tempo.


Nós estamos dentro do fio da infinitude e não fóra.  Por isso, somos limitados e somos prisioneiros dessa infinitude de nascimentos, crescimentos, envelhecimentos,  adoecimentos e mortes.  E tudo isso sempre se repetirá.

Todo o trabalho do Taoísmo é para que possamos colocar nossa consciência para além desse fio, para alcançar este Vazio, esse Vazio que abraça esse fio, para compreendermos a infinitude da vida.  assim, podemos transcender a vida e a morte.

Esse fio é a palavra ‘existência’.
Esse Vazio que abraça, que abrange este fio, é a não-existência.


Por isso, Lao Tse diz:

“Os seres sob o céu nascem da existência
e a existência nasce da não-existência”


“sob o céu” é uma maneira poética de dizer ‘no mundo’.

Nós estamos nascendo e morrendo infinitamente dentro desse fio.  E esse fio nasce do Vazio.

Devemos então levar nossa consciência para o estado do Vazio, para que nosso corpo se torne o próprio fio, para que o infinito universo seja nosso próprio corpo e para que nossa consciência seja esse Vazio que abraça o infinito universo.

A meditação é um processo para nos libertar da vida, sem renunciarmos à vida.

Na verdade, na vida a nada se renuncia.  Precisamos nos libertar da vida sem renunciar a ela.





Capítulo 40

O retorno é o movimento do Caminho
A suavidade é a atuação do Caminho
Os seres sob o céu nascem da existência
E a existência nasce da não-existência

...............

Foto: Sítio das Estrelas, Janine

TAO TE CHING

O LIVRO DO CAMINHO E DA VIRTUDE

Lao Tse, o Mestre do Tao

Tradução e Interpretação do Capítulo 40
do Tao Te Ching, de Lao Tse,
por WU JYH CHERNG

Transcrição e Síntese de Aula Gravada na Sociedade Taoísta do Brasil,
Rio de Janeiro, em 25 de abril de 1995

Transcrição e Síntese de Janine Milward


A tradução dos Capítulos do Tao Te Ching foi realizada por Wu Jyh Cherng,
do chinês para o português,
 e foi primeiramente publicada pela Editora Ursa Maior,
sendo hoje  publicada pela Editora Mauad, São Paulo, Brasil

Nesta mesma Editora, encontra-se ainda no prelo
a realização da publicação, em breve, das interpretações de Wu Jyh Cherng
 acerca os 81 Capítulos da obra máxima de Lao Tse, o Tao Te Ching