O que é a vida infinita? O que é infinitude? Infinitude é algo que não pode ser rompido, partido.




O que é a vida infinita?


O que é infinitude?

Infinitude é algo que não pode ser rompido, partido.

Wu Jyh Cherng




A unidade é algo anterior à separação das coisas.


Na seqüência matemática dos números, depois do Zero vem o Um, depois vem o Dois, depois vem o Três, e assim por diante.

O Um é o primeiro número e ao mesmo tempo é o numero que representa a potencialidade de todos os outros números.

O Dois está dentro do Um.  O Três está dentro do Dois e o Quatro está dentro do Três e assim, todos os números estão dentro do anterior.

O número Um representa a potencialidade de todos os números.  Se os números representam a variedade dos seres, o Um representa a potencialidade de cada ser, em todos os seres.  E é também a soma de todos os seres.

Esse Um, por ser anterior à atualização, e por ser algo indivisível, pode ser considerado como algo espiritual e como algo material.  É um estado onde o espírito e a matéria não estão separados.  É um estado onde a consciência e a energia não estão separados.

Nós vivemos no estado dual, no estado do complexo, do múltiplo.

Todos nós temos normalmente uma polarização entre a consciência e a energia.  Ora é a energia desequilibrada que influencia nossa atividade mental e emocional, ora nossa alteração emocional e mental promovem uma transformação e uma modificação energéticas.

No estado do Um, no estado do indivisível, a Energia e a Consciência são a mesma coisa.

A Consciência é a própria Energia.  A Energia é a própria Consciência.

Esse estado do Um, do indivisível, é algo um pouco difícil de ser imaginado por nós.

Esse estado do Um é considerado neste Capítulo por Lao Tse como a raiz de todas as manifestações.  E Ele também considera a aquisição ou a existência desse Um em cada ser - ou a restauração - como a permissão de retornarem ao estado da naturalidade, de retornarem ao estado do  equilíbrio.

Ele diz:

Esses adquiriram o Um na antiguidade:

O Céu adquiriu o Um e tornou-se transparente
A Terra adquiriu o Um e tornou-se tranqüila
O espírito adquiriu o Um e tornou-se desperto
Os vales adquiriram o Um e tornaram-se opulentos
Os dez mil seres adquiriram o Um e tornaram-se vivos
Os príncipes e os reis adquiriram o Um e tornaram-se o eixo do mundo
Esses alcançaram a supremacia.

Esses versos são de plena simbologia. 


Desmembrando a primeira frase:

Esses adquiriram o Um na antiguidade

Antiguidade tem o sentido de ‘origem’, de fonte inicial.  Lao Tse diz que o Um é a fonte inicial.

O Um é a primeira manifestação.

A primeira manifestação do universo é a manifestação a partir da raiz do universo.

O que é a raiz do universo? 

É uma espécie de Vazio e não-existência.  É uma espécie de não-manifestação que permite a manifestação.

A primeira manifestação do universo é o Um.

E o Um veio do Zero.  O Zero é a raiz de todas as coisas.

O Um é  o princípio, o início.

‘o Um na antiguidade’ significa a manifestação do princípio.

No estado da manifestação do princípio, o Céu, a Terra, o Espírito, os vales, os dez mil seres, os príncipes e os reis conseguiram adquirir todas essas qualidades: a transparência, a tranqüilidade, o despertar, a opulência, a vida e o  eixo do mundo.

É bom lembrarmos que no estudo filosófico do Taoísmo, esse Princípio Inicial, o Um da antigüidade, o Um da raiz de todas as coisas, o princípio inicial da existência, não significa uma distância de tempo.  ou seja, não significa um tempo atrás quando tudo teve começo.... Não.   Esse princípio inicial é um estado, é uma qualidade.

O Princípio Inicial pode ser encontrado em todas as épocas, em todos os momentos, em todos os lugares.  É um nível de consciência, é um estado do ser.  Cada ser, dependendo do nível em que está atuando, pode estar no estado do Princípio Inicial como no estado da multiplicidade, da complexidade.           

Quando a Consciência e a Energia se fundem, e a pessoa está atuando no estado do Princípio Inicial, estará vivendo a vida infinita. 

Quando a consciência e a energia não conseguem se fundir, e não existe o estado do princípio inicial, a pessoa está no nível da complexidade, da multiplicidade.

No estado da Consciência e da Energia fundidas - no estado do Princípio Inicial - não importa em que época seja, essa pessoa está vivendo no estado da infinitude onde o tempo e o espaço não podem limitar sua existência.

Quando a consciência da pessoa não está no princípio inicial e sim no estado da complexidade, da fragmentação - não importa qual a época que seja -, essa pessoa estará vivendo o estado das infinitas e inúmeras vidas e mortes.

O que é a vida?

O que é a morte?

Vida e morte são a ruptura, a rachadura, a separação.

O que é a vida infinita?

O que é infinitude?

Infinitude é algo que não pode ser rompido, partido.

Se a consciência de uma pessoa pode ser partida, essa consciência é uma consciência feita de início, durante e fim; início, durante e fim; início, durante e fim, com inúmeros fragmentos.

Quanto maior a complexidade, maior fragmentação.  Quanto maior fragmentação em nossa consciência, em nosso espírito, mais vida e morte existirão dentro de nós.

Quanto maior grau e maior quantidade de vida e morte dentro de nós, maior sofrimento pelo ganho e pela perda.

Fragmentação é ruptura, é não nos permitir desfrutar a totalidade das coisas.  Estamos sempre construindo algo e perdendo algo.  Dessa maneira, nunca sentiremos a plenitude, não importa em que, sempre sentiremos frustração, uma sensação de incompletude.

Essa sensação de incompletude nos traz incessantes ansiedades, inquietações.  E tudo isso é a semente que nos leva a entrar num ciclo vicioso de outras buscas, outras conquistas e outras perdas.

A cada passo que caminhamos para frente, ganhamos novo tempo e novos momentos ... mas, simultaneamente, estamos perdendo o antigo tempo e os antigos momentos.  Trabalhos ganhos, trabalhos perdidos.  Pessoas ganhas, pessoas perdidas.  Amizades ganhas, amizades perdidas.  Sentimentos ganhos, sentimentos perdidos.  Memórias renovadas e memórias perdidas...

Assim, em cada segundo, em cada minuto, em cada vida que reencarnamos e transmigramos, repetimos e vivemos na infinitude fragmentada.  Não temos consciência da infinitude da vida e da consciência e , ao mesmo tempo, sofremos a fragmentação da vida e da morte, dentro da infinitude.

Esse é o não-despertar do espírito, ou seja, a consciência não-despertada.



Capítulo 39


Esses adquiriram o Um na antiguidade:

O Céu adquiriu o Um e tornou-se transparente
A Terra adquiriu o Um e tornou-se tranqüila
O espírito adquiriu o Um e tornou-se desperto
Os vales adquiriram o Um e tornaram-se opulentos
Os dez mil seres adquiriram o Um e tornaram-se vivos
Os príncipes e os reis adquiriram o Um e tornaram-se o eixo do mundo
Esses alcançaram a supremacia.

O céu, não se tornando transparente, irá rachar
A terra, não se tornando tranqüila, irá temer estremecer
O espírito, não se tornando desperto, irá temer exaurir
Os vales, não se tornando opulentos, irão temer secar
Os dez mil seres, não se tornando vivos, irão temer se extinguir
Os príncipes e os reis, não se tornando nobres, irão temer a derrota.

Por isso,
O nobre utiliza a humildade como princípio
O alto utiliza o baixo como base.

Sendo assim,
Os príncipes e os reis denominam-se a si mesmos de órfãos, carentes e indignos
Isso seria utilizar a humildade como princípio, não seria?

Por isso,
Alcançar o valor é aproximar-se do não-elogio
Não desejando o vulgar como o jade
Sendo simples como a pedra.

...............

Foto: Sítio das Estrelas, Janine



TAO TE CHING

O LIVRO DO CAMINHO E DA VIRTUDE

Lao Tse, o Mestre do Tao

Tradução e Interpretação do Capítulo 39
do Tao Te Ching, de Lao Tse,
por WU JYH CHERNG

Transcrição e Síntese de Aula Gravada na Sociedade Taoísta do Brasil,
Rio de Janeiro, em 18 de abril de 1995

Transcrição e Síntese de Janine Milward


A tradução dos Capítulos do Tao Te Ching foi realizada por Wu Jyh Cherng,
do chinês para o português,
 e foi primeiramente publicada pela Editora Ursa Maior,
sendo hoje  publicada pela Editora Mauad, São Paulo, Brasil