Um caminho de segredos, um caminho interior




 Um caminho de segredos, um caminho interior

Wu Jyh Cherng


Nosso corpo é um pequeno reino. Temos mil pedacinhos dentro de nós.  E temos um  governante que é nossa consciência, nossa mente.  Nossa consciência faz com que nosso corpo, ou seja, nossa totalidade, possa fluir sem sentir o peso da consciência.  e a consciência nunca deixa de fazer as coisas.  Apenas que deve ser transparente, menos julgadora, mais quieta, ouvindo as necessidades de cada célula, de cada osso, de cada músculo.  Não através de um processo racional mas através de um processo natural de correspondência que a tudo  soluciona, fazendo com que o corpo todo fique em harmonia.

Isso é a primeira governança.  Através desse conceito do Taoísmo, a pessoa dá seu primeiro passo na convivência com tudo.  E usa esse mesmo princípio para administrar tudo aquilo que está em torno de sua vida, sua família, seu trabalho, todo o ciclo.  Realizando a vida nesse princípio, a pessoa pode expandir e organizar sua convivência com o mundo inteiro.

A consciência é o núcleo de onde tudo gira em torno: nosso corpo, nosso sangue, nossa energia, tudo o que está vivo em nós.  Nosso espírito, nossa consciência é um centro de gravidade, como se fosse um imã.

Igualmente, o homem, através de um processo de auto-realização, se torna um espírito puro que se amplia se tornando um espírito iluminado em nível individual, depois familiar e social, então da sociedade e muitas pessoas girarão em torno desse Espírito Iluminado.  Quanto maior o grau de Iluminação, maior grau se torna o Espírito para o mundo.  Esse é o processo de Sagração do Homem.

Isso é o que chamamos de Tao.

O Tao é algo bonito, algo como a união da consciência e a vida, algo vital que possui em si uma consciência.


Para isso acontecer, em nossa prática de meditação, temos que colocar a consciência dentro do ar que respiramos.

Com o tempo, em nossa meditação, a respiração vai ficando mais lenta, mais lenta até que a respiração física fica praticamente parada.  Ficamos todo o tempo observando a respiração e chaga uma hora em que não se tem mais respiração.  Com o tempo, se sente uma força suave, bem suave e vamos nos integrando com esta força.  Essa experiência é invisível, inaudível e impalpável, porém existente.


No Taoísmo, existe um conceito muito importante sobre o Caminho Esotérico.  Essa definição diz que o Caminho Esotérico não significa astrologia, tarot, magia, etc.  O Caminho Esotérico é uma experiência que somente a pessoa pode saborear.  Onde a consciência rompe as barreiras daquilo que é visível, audível e palpável.  É quando a consciência consegue romper as barreiras físicas do visual, do auditivo e do sensorial e consegue entrar no universo.  E aí encontra uma força, que é a força primordial, uma força que é a raiz do universo.  É quando se consegue mergulhar para dentro desse universo, dessa força, e fluir com esta força e se tornar a própria força.

Nesse momento, se alcança uma experiência que não pode ser descrita através das palavras ou das imagens ou da forma ou da linguagem.

Uma sensação, uma compreensão, uma consciência que só nós sabemos que lá chegamos.  Isso é o Caminho Esotérico.  Um caminho de segredos, um caminho interior.  Interior no sentido de que não é visível aos outros.


Nos trechos posteriores, Lao Tse vai falar sobre isso.  Essa experiência é uma experiência única, ou seja, é uma experiência que não dividimos com ninguém.  Não existem polaridades, estamos num estado onde tudo é um só.  É como se tivéssemos diferentes cores de tinta, vermelho, azul, amarelo, verde, laranja... e, ao juntá-las todas, teremos uma mistura, sem nenhuma definição.

A nossa consciência, em sua viagem interior, chega a um ponto onde não existe a separação das coisas.  É algo indivisível e inseparável como se fosse um caos - esse caos é exatamente a raiz do universo.  É lá que nascem todas as forças e todos os verdadeiros e eternos poderes que geram os seres, os planetas, as galáxias e todos os espíritos.

Nessa hora se chegou à raiz do universo e nos tornamos a raiz do universo.  A raiz do universo é o que chamamos de caos primordial.

Para se mergulhar no caos primordial, é preciso ter despojamento, tirar as amarras, as limitações e, inevitalmente, jogar o ego fóra.

Entramos profundamente e quando atingimos a raiz do universo, passamos a ser o centro de todas as coisas, e então podemos perceber que tudo aquilo que jogamos fóra, não foi perdido, simplesmente se tornou periferia em nossa vida e não mais o centro de nossa vida.

Portanto, o Homem Sagrado que alcança a plenitude da vida e da consciência, não se torna incapacitado nem perde a memória, pelo contrário, ele passa a ser a raiz que tem acesso a todas as atividades, trabalhos e acontecimentos.  Ele passa a ter suas potencialidades aumentadas e não diminuídas.

Para se descobrir essa experiência não precisa se chegar até a raiz.  Existem muitas dimensões com estágios da consciência de acordo com o nível em que estamos vivendo.  De uma raiz nascem dois terminais que se expandem até o infinito, progressivamente.  Nessas infinitas expansões, existe um centro.

Na prática mística, esse mergulho ao caos primordial é gradual, leva tempo; às vezes anos e anos  ou mesmo vidas e mais vidas para se realizar essa viagem.  Cada vez se consegue ir mais profundamente.

Na prática mística, vemos que a consciência, em vez de se limitar, se amplia.  Não precisa se atingir o último ponto - o caos primordial - para poder abraçar todas as coisas.  Andando um milésimo, teremos um milésimo de resultado que é análogo ou similar a aquele de quem chegou até o centro, à raiz.  Apenas que, quem atinge o centro, atinge uma plenitude absoluta.  Quem alcança outros pontos, atinge uma plenitude mais limitada.  No entanto, sempre haverá uma ampliação da consciência.

Por isso, a prática da meditação é essencial.  É um instrumento para desenvolvermos nossa ascensão.

Por que se faz isso?

Porque numa condição comum, é muito difícil realizar a subida da consciência.  Nossos hábitos, costumes e problemas cotidianos nos viciam.  Comportamentos de ira e de raiva fazem com que nossa consciência não transcenda.

Por isso devemos, diariamente, tirar uma hora do nosso cotidiano de vida, sem interferência de ninguém, para podermos desenvolver essa quietude interior para se tentar mergulhar no caos primordial.


Capítulo 14


Aquilo que se olha e não se vê, se chama invisível
Aquilo que se escuta e não se ouve, se chama inaudível
Aquilo que se abraça e não se possui, se chama impalpável
Estes três não podem ser revelados
Por isso se fundem e  se tornam um

Quando superior não é luminoso
Quando inferior não é vago

O Constante que não pode ser nomeado
É o retorno à não-existência
É a expressão da não-expressão
É a imagem da não-existência
A isso se chama indeterminado

Encarando-o, não vejo sua face
Seguindo-o, não vejo suas costas

Quem mantém o Caminho Ancestral,
Poderá governar a existência presente
Quem conhece o Princípio ancestral,
Encontrará a ordem do Caminho


Foto: Sítio das Estrelas, Janine


TAO TE CHING

O LIVRO DO CAMINHO E DA VIRTUDE

Lao Tse, o Mestre do Tao

Tradução e Interpretação do Capítulo 14
do Tao Te Ching, de Lao Tse,
por WU JYH CHERNG

Transcrição e Síntese de Aula Gravada na Sociedade Taoísta do Brasil,
Rio de Janeiro, em 13 e 20 de setembro de 1994

Transcrição e Síntese de Janine Milward


A tradução dos Capítulos do Tao Te Ching foi realizada por Wu Jyh Cherng,
do chinês para o português,
 e foi primeiramente publicada pela Editora Ursa Maior,
sendo hoje  publicada pela Editora Mauad, São Paulo, Brasil

Nesta mesma Editora, encontra-se ainda no prelo
a realização da publicação, em breve, das interpretações de Wu Jyh Cherng
 acerca os 81 Capítulos da obra máxima de Lao Tse, o Tao Te Ching