O que é o Caminho espiritual? O que é o Tao? Como viver o Tao?
Wu Jyh Cherng
O Caminho é eterno e não tem nome
É genuíno e embora pequeno
O mundo não tem coragem de dominá-lo
É genuíno e embora pequeno
‘Pequeno’ significa essência.
O átomo é pequeno e cabe em tudo, em tudo existe o átomo. O Tao é a essência de todas as coisas, é algo
que, apesar de invisível, está por detrás de todas as coisas e está em toda a
parte. Por isso é pequeno, é genuíno, é
algo puro. Existe Tao num cachorro, numa
pessoa, numa montanha, no rio. Podem o
cachorro e a pessoa ser diferentes, mas o Tao que neles existe, é o mesmo.
Lao Tse quer nos dizer que a essência, a existência, é única embora
as coisas sejam diversas e diferentes em diferentes épocas e lugares.
O mundo não tem coragem de
dominá-lo
O mundo não tem força para dominar, para inibir ou para não
permitir que essa essência, essa síntese, se manifestar. Ou seja, é impossível fazermos com que o Tao
seja limitado de uma maneira ou de outra.
O Tao está em toda parte.
A prática espiritual do Taoísmo enfatiza que precisamos encontrar
essa essência. Precisamos encontrar essa
síntese, essa essência que está por detrás de todas as coisas, de todos os
seres. Sabendo encontrá-la,
encontraremos uma consciência que é comum a todos e encontraremos também a
energia que é comum a todos. Essa
consciência e essa energia - no estado de essência - não são separadas, ou
seja, na essência, a vida e a consciência são a mesma coisa.
Esse algo que Ele chama de ‘genuíno’ e ‘pequeno’ é uma consciência
pura e uma vida pura que existem, que é o próprio Tao, eterno, sem nome, que
está em toda a parte e que apenas podemos senti-lo, percebe-lo e vivenciá-lo -
uma vez vivamos o Tao.
Como viver o Tao?
Praticando. Praticando na
vida cotidiana, através da meditação, em cada gesto, procurando sensivelmente
perceber, sentir a presença do Tao nas pessoas, nos seres, nas coisas, em tudo
o que se possa e não possa imaginar. Em
tudo se encontra o Tao.
Dessa maneira, podemos viver no mundo diante das adversidades e das
diferentes pessoas e concepções, a tudo encarando com o mesmo espírito e o mesmo
sentimento. Porque nossa relação com o
mundo como um todo se dará pela essência e não pela periferia ou pela
superficialidade.
Normalmente, tendemos a julgar o certo e o errado pela forma e
imagem que a situação é mostrada e não pela essência, ou seja, a intenção ou o
sentimento contidos na situação.
Se encararmos tudo o que existe no universo pela sua essência,
chegaremos à conclusão de que tudo é igual.
Não existiriam então da discriminação e o preconceito e existiria sim
uma aceitação e um respeito em relação a tudo e a todos, através das diversas
formas de expressão existentes no mundo.
Essa é a concepção essencial do Taoísmo. E como se posiciona o Taoísmo - enquanto
ensinamento místico ou como religião - diante das outras religiões e dos outros
pensamentos?
De forma igual. O Taoísmo vê
todas as religiões e doutrinas místicas como infinitas e variáveis expressões
naturais existentes. E vê que, por
detrás de todas elas existe uma essência comum a todas. E entende que não é porque a essência é comum
que todas suas expressões sejam iguais.
A expressão não é igual. A
essência é que é igual. O Taoísmo
confraterniza pela essência mas não precisa necessariamente misturar as
linguagens. O Taoísmo é uma tradição que
enfatiza que cada pessoa deve encontrar - entre as inúmeras linguagens - aquela
linguagem que mais lhe convém para sua realização e através da linguagem
escolhida, alcançar sua essência. E ao
mesmo tempo reconhecer, em última análise, que a essência de todas as religiões
e doutrinas místicas, é a mesma. No
entanto, reconhecer que o caminho para se alcançar essa essência, não é o mesmo
- porque a expressão é diferente.
O Taoísmo respeita, portanto, todas as expressões porque todas elas
são um caminho para se chegar à essência.
Interiorizando-se sob uma forma ou outra forma, chega-se à
essência. A essência é igual. Como se fosse uma grande pirâmide de quatro
faces e inúmeros caminhos e escadarias para se atingir a cúspide.
Entretanto, o Taoísmo não é a favor do sincretismo das tradições,
das linguagens. Porque cada linguagem é
um caminho e cada caminho desencadeia mecanismos que nos leva a caminhar. Como numa corrente, anda-se elo após elo.
O Taoísmo considera, então, que cada tradição se expressa com sua
própria característica e que o aprendiz precisa intuitivamente e racionalmente
buscar sentir e encontrar o seu caminho e escolher um só caminho para poder
atingir assim, a profundidade das coisas.
É na profundidade que se encontra a essência. E, uma vez se encontrando a essência, alcança-se
o estado Universal. Nesse estado,
podemos até compreender as expressões das outras tradições.
Antes desse estado, apenas se consegue fazer a mistura das expressões.
Cada expressão tem o seu próprio encadeamento. Nós não precisamos ter todos os caminhos
dentro de nós. Precisamos apenas de um
caminho no qual nos definimos.
Como podemos perceber se estamos no caminho certo?
Através da nossa real transformação.
O que se transforma em nós?
Nossa energia, nossa emoção, nossa mente. Numa realização espiritual real, no final de
nossa vida, sentimos que essas transformações aconteceram. No entanto, se as pessoas saem e entram em
várias tradições, as transformações não acontecem, ou acontecem no sentido de
trazer às pessoas a fragmentação e a frustração do não-desenvolvimento. Apegos, medos emoções incontroláveis não
devem mais existir no final da vida por causa da real transformação.
Ao morrermos e transmigrarmos para outra vida, os conhecimentos
intelectuais religiosos não ajudarão em nada.
O que realmente nos ajuda - mesmo que não atinjamos a iluminação - é a
real transformação, é aquilo que muda em nós, ou seja, a aproximação da nossa
consciência à essência: quanto mais próximos estivermos na consciência
essencial, menos loucuras teremos e mais genuínos, mais transparentes seremos
interiormente.
O curso natural de uma vida é geralmente o inverso. A criança nasce com pureza e
genuinidade. Quanto mais vive, mais os
complexos e neuroses vêm à tona. A vida
vai ficando mais pesada e mais periférica.
E o que é o Caminho espiritual? O que é o Tao?
É tentar resgatar e retornar a esse princípio, retornar à essa
essência. Para isso, ao iniciarmos a
busca, precisamos ver qual é o caminho que melhor se adapta a nós para irmos
mais e mais profundamente.
O Taoísmo é um dos caminhos que existem. O caminho do Taoísmo não se diz ser o melhor
dos caminhos. O melhor caminho é aquele
que cada pessoa escolhe. O melhor
caminho para a pessoa que se sente Taoísta é o Taoísmo.
Como cada caminho é um veículo para transmutar nossa mente, nossa
emoção, nosso corpo... nossa energia, para nos transmutar essencialmente,
devemos usar o veículo com seus recursos
e potencialidades para a transmutação e não apenas para adquirir conhecimentos
sobre esse veículo, ou seja, sobre um caminho.
Desde que nascemos estamos envolvidos por uma grande ilusão que faz
com que vivamos no estado da ignorância e do sofrimento. Estamos limitados pela vida, pelo
envelhecimento, pela doença e pela morte.
Dessa maneira, não temos tempo a perder, temos urgência em nos realizar.
Lü Tzu disse que mesmo começando cedo, já está tarde. Começar o que? Começar a nos trabalhar, tentar nos
transformar. E como somos muito limitados
em forma, linguagem, tipo de personalidade, precisamos encontrar um veículo
ideal para nos adaptar a ele e o utilizarmos para a nossa transformação. No final da caminhada, não precisaremos mais
do veículo porque nos tornaremos o próprio veículo.
No cristianismo, Jesus Cristo se realizou a tal ponto que se tornou
Ele mesmo um caminho para os outros. E
ele seguiu o seu próprio caminho.
Quem chega à plenitude da realização, pode se tornar um caminho
para os outros.
O Taoísmo não pretende ser a única verdade. Mestre Maa fala sobre a imparcialidade do
Taoísmo, quando diz:
Para o Tao, quando o homem
deseja a vida, encontra a vida
Quando o homem deseja a morte,
encontra a morte.
Nosso caminho é nossa responsabilidade. Disso surge a concepção do Karma no
Taoísmo: o que vivemos hoje, formulará o
nosso amanhã. Nós somos os responsáveis
pelo nosso caminho.
A interferência que existe nesse caminho vem através da forma de
ensinamentos: ensinamentos visíveis e ensinamentos invisíveis, transmitidos
pelos mestres e pelas divindades, uma espécie de força que nos perpassa de uma
maneira inconsciente: a palavra, o silêncio, a expressão do céu e da terra, a
água da montanha, a natureza, o sentimento humano. Aprende-se através dos próprios erros e
através dos erros dos outros.
Capítulo 32
O Caminho é eterno e não tem nome
É genuíno e embora pequeno
O mundo não tem coragem de dominá-lo
Se reis e príncipes pudessem preservá-lo
Os dez mil seres iriam por si próprios obedecer
Quando o céu e a terra unem-se
Para escorrer o doce orvalho,
O povo não pode interferir nisso, que por si é uniforme.
O princípio domina a existência e o nome
Então o nome passa a existir
E irá também saber cessar
Sabendo cessar não perecerá
A relação do mundo com o Caminho
É como a dos riachos e dos vales
Com os rios e mares
...............
Foto: Sítio das Estrelas, Janine
TAO TE CHING
O LIVRO DO CAMINHO E DA VIRTUDE
Lao Tse, o Mestre do Tao
Tradução e Interpretação do Capítulo 32
do Tao Te Ching, de Lao Tse,
por WU JYH CHERNG
Transcrição e Síntese de Aula Gravada na Sociedade Taoísta do Brasil,
Rio de Janeiro, em 28 de fevereiro de 1995
Transcrição e Síntese de Janine Milward
A tradução dos Capítulos do Tao Te Ching foi realizada por Wu Jyh Cherng,
do chinês para o português,
e foi primeiramente publicada pela Editora Ursa Maior,
sendo hoje publicada pela Editora Mauad, São Paulo, Brasil
Nesta mesma Editora, encontra-se ainda no prelo
a realização da publicação, em breve, das interpretações de Wu Jyh Cherng
acerca os 81 Capítulos da obra máxima de Lao Tse, o Tao Te Ching