não podemos anular a Consciência pura da pessoa
Wu Jyh Cherng
Não julga por si, por isso é
óbvio
Não vê por si, por isso é
resplandecente
Não se vangloria, por isso há
realização
Não se exalta, por isso cresce
Só por não disputar, nada pode
disputar com ele
Quando se quer entrar num lugar sem ser percebido, a pequena mágica
que se faz é exatamente se colocar na quietude.
Tendo o silêncio interior, a gente se torna menos visível, menos
perceptível. Então, nos tornamos
invisíveis entre as pessoas, chamando menos atenção, sendo menos notável.
Isso é contrário aos valores sociais comuns, sobre os quais
anteriormente citamos. Tudo tem que ser
pleno, ninguém pode se curvar, todos têm que ser alguém, numa personalidade
forte, ninguém quer ser invisível.
Não julga por si e não vê por si - significa não apegar-se ao ego. Quando não se vê por si, se vê através dos
olhos de todos os seres.
Não julgar por si é deixar que a coisa se mostre por si mesma, que
se revele.
Qual a diferença entre o julgar e o discernir?
Discernir é saber ter uma quietude e observar a natureza,
simplesmente. Ver as coisas como elas
são.
Julgar é colocar um conceito mais radical e mais rígido nas coisas
que vemos. Então, as coisas deixam de
ser o que elas são. E passam a ser
camufladas por nossa mente.
Portanto, não julgando, nós simplesmente encaramos as coisas como
elas são e então, passamos a ter discernimento.
No não-julgamento, no discernimento, podemos ver as coisas como
elas naturalmente são e, em seguida, podemos agir de acordo com o que precisa
ser feito. Isso é o que Lao Tse chama de
‘naturalidade’. Fazer as coisas
naturalmente, sem deixar de fazê-las; e quando tiver que fazê-las, fazê-las.
Quanto menos palavras exteriores ou interiores existirem, o
julgamento fica mais no nível do discernimento.
Quando se explica demais, caímos no julgamento.
No discernimento, temos que trabalhar mais com a Consciência do que
com a mente.
Quando não conseguimos chegar à consciência, devemos pelo menos
usar a intuição - que é mais próxima da Consciência pura do que a mente. A mente é muito complexa.
Quando percebemos que a mente está camuflando, usamos a
Consciência. Não conseguindo usar a
Consciência, usamos a intuição. A
intuição, no entanto, já é influenciável pela mente. Também, às vezes, a mente consegue funcionar
próxima da Consciência.
Não se vangloria, por isso há realização - para nos realizarmos e
crescermos, precisamos ter humildade.
Temos que ter a vontade de realizar as coisas, temos que ter a
Consciência pura para realizar as coisas naturalmente e ao mesmo tempo, temos
que saber não nos vangloriamos nem nos exaltarmos diante de nossos feitos.
Mestre Maa nos diz que ‘não se exaltar, significa ter
humildade’. Sempre devemos considerar os
frutos de nossa realização como resultados da bondade celestial, das virtudes
dos ancestrais e das virtudes dos mestres e das outras pessoas. É sempre bom atribuirmos aos nossos
ajudantes, as nossas realizações. Isso
mostra uma maneira humilde de ser.
Novamente, essa questão entra em divergência com a cultura
contemporânea.
Mesmo dentro do Taoísmo, se diz que se a pessoa não batalhar para
trabalhar e realizar as coisas materialmente e espiritualmente, nada poderá ser
realizado porque nada cai do céu.
Isso é uma metade do conceito e é para incentivar as pessoas a
empreenderem e a realizarem.
A outra metade do conceito, revela-se ao contrário. Diz que uma vez realizado o trabalho,
agradece-se a ajuda e a proteção das divindades que nos acompanham e dos
mestres que nos direcionaram, e dos pais que nos educaram... A partir daí, todas as coisas realizadas
passam a ser não um mérito pessoal mas sim mérito de um conjunto.
A primeira metade do conceito fala da necessidade de batalhar, de
agir para realizar as coisas e a segunda metade fala em aceitar todos os frutos
da realização com profunda gratidão.
O que falta à sociedade moderna é exatamente esse sentimento de
gratidão. Gratidão é um sentimento. E não é um sentimento teórico. No entanto, a cultura comum está fundamentada
na auto-realização do homem que deve saber lutar pelo que quer e que deve se
sentir realizado e colhedor dos frutos que semeou.
Devemos sempre ter gratidão pelo que recebemos, uma profunda
gratidão que deve estar no fundo da nossa alma.
Devemos sempre fazer o melhor possível para passar para frente os frutos
do nosso trabalho, não nos vangloriando nem nos exaltando. Assim, cresceremos e nos realizaremos de
verdade.
Só por não disputar, nada pode disputar com ele - Lao Tse, em outro Capítulo do Tao Te Ching,
diz que
O homem se orienta pela terra
A terra se orienta pelo céu
O céu se orienta pelo Tao
E o Tao se orienta por sua
própria natureza
Se pensarmos nisso em uma hierarquia mecânica, o homem depende da
Terra para viver, a Terra depende do cosmos para viver, o cosmos dependo do Absoluto
para existir e o Absoluto depende de si próprio.
Então, o mais alto é o próprio Tao, o Tao que está em toda a parte
e em todas as pessoas. O Tao não briga
com ninguém, não disputa com ninguém, não impõe nem obriga. O Tao simplesmente é uma Consciência quer
permite tudo girar em torno dele, alimenta todos os seres e permite todas as
coisas existirem e permite aos seres e a sociedade fazerem suas vidas, seus
destinos, naturalmente.... muitas vezes, contrariando as leis da naturalidade e
do equilíbrio - mas o Tao permite.
O Tao não disputa com ninguém e ninguém pode disputar com o
Tao. O Vazio não briga com nenhuma forma
e nenhuma forma é capaz de derrubar o Vazio.
Podemos derrubar a palavra da pessoa, a força da pessoa, mas não
podemos anular a Consciência pura da pessoa.
Essa é a força que existe no espírito das pessoas. Se alguém não disputa nada com ninguém,
ninguém pode disputar nada com esse alguém.
Num nível mais rasteiro, se
uma pessoa tem a consciência de si mesma, não precisa disputar com
ninguém. Simplesmente faz o que deve
fazer em sua vida, em seu destino, e pronto.
Também ninguém pode disputar nem brigar com essa pessoa.
Capítulo 22
Curvar-se permite a plenitude
Submeter-se permite a retidão
Esvaziar-se permite o preenchimento
Romper permite a renovação
Possuir pouco permite a aquisição
Possuir muito permite a ganância.
Por isso, o Homem Sagrado abraça a Unidade
Tornando-a modelo sob o céu
Não julga por si, por isso é óbvio
Não vê por si, por isso é resplandecente
Não se vangloria, por isso há realização
Não se exalta, por isso cresce
Só por não disputar, nada pode disputar com ele
Antigamente se dizia: “Curvar-se permite a plenitude”.
Como poderiam ser palavras vazias?
Assim, ao alcançar a plenitude, encontra-se o retorno
...............
Foto:Sítio das Estrelas, Janine
TAO TE CHING
O LIVRO DO CAMINHO E DA VIRTUDE
Lao Tse, o Mestre do Tao
Tradução e Interpretação do Capítulo 22
do Tao Te Ching, de Lao Tse,
por WU JYH CHERNG
Transcrição e Síntese de Aula Gravada na Sociedade Taoísta do Brasil,
Rio de Janeiro, em 06 de dezembro de 1994
Transcrição e Síntese de Janine Milward
A tradução dos Capítulos do Tao Te Ching foi realizada por Wu Jyh Cherng,
do chinês para o português,
e foi primeiramente publicada pela Editora Ursa Maior,
sendo hoje publicada pela Editora Mauad, São Paulo, Brasil
Nesta mesma Editora, encontra-se ainda no prelo
a realização da publicação, em breve, das interpretações de Wu Jyh Cherng
acerca os 81 Capítulos da obra máxima de Lao Tse, o Tao Te Ching