Quatro Tarefas para Alcançarmos a Imortalidade
Wu Jyh
Cherng
O conceito da Imortalidade, segundo o Taoísmo, significa Vida e
Consciência Infinitas. Segundo Lao Tse,
para se alcançar isso é necessário realizar quatro tarefas, simbolicamente
falando:
Cegando-se o corte
Desatando-se o nó
Harmonizando-se à luz
Igualando-se a poeira
Cegando-se o corte - Tirando o fio, a parte afiada de nossa vida. Uma pessoa esperta, uma pessoa engenhosa, é
muito afiada. Temos que retirar essa
parte afiada que existe dentro de nós para voltarmos a ser mais naturais, mais
rústicos.
Desatando-se o nó - Quando você tem uma linha
e dá um nó, chega um momento em que a linha não pode mais ser usada, não passa
na agulha. O nó simboliza, portanto, os
bloqueios que existem dentro de nós.
Todas as vezes que vivemos um trauma, uma situação difícil, alguma cosia
fica bloqueada dentro de nós e é como se fosse um nó atado interiormente. Desde que nascemos e atravessamos um longo
tempo em nossa vida, convivemos com a felicidade, a tristeza, com os sofrimentos
e as alegrias, com as realizações e as frustrações... Tudo isso acaba formando os inúmeros nós que
existem dentro de nós. Para que a
energia do Absoluto possa fluir, para que nossa consciência possa ser livre
para pensar, sentir e compreender as coisas, precisamos desatar os nós
interiores, precisamos nos desbloquear.
Harmonizando-se à luz - Mestre Maa, nosso Mestre,
uma vez me disse algo muito interessante:
“Cada um de nós tem uma consciência.
Essa consciência é como se fosse uma luz. Quanto maior o grau de consciência, mais
lucidez possuímos”.
Quando uma pessoa atinge o estado que se chama Iluminado, alcança
uma espécie de lucidez interior plena.
Essa lucidez faz com que nós consigamos contemplar as coisas de forma
muito clara. Esse é o conceito da
Iluminação. Cada um de nós já possui
essa lucidez, intrinsecamente. Ela
poderá estar meio empoeirada ou reprimida.
Quando conseguimos atingir essa luz dentro de nós, juntando-a com a
grande fonte de luz bem maior, a luz individual funde-se com a luz
coletiva. A luz egóica funde-se com a
luz universal.
Imagine um lugar com muita luz enquanto você está em outro lugar
com pouca luz. Você acende uma
lanternazinha e percebe essa pequena luz.
Quando você leva sua lanterna acesa para aquele salão todo iluminado, vê
que sua lanterna não irradia mais luz - ou quase nenhuma.
É preciso unir a micro-Consciência com a macro-Consciência. E mais ainda, é preciso unir a Consciência
manifestada ou Consciência do Céu Posterior com a Consciência do Céu Anterior,
do não-manifestado. É preciso unir a
Consciência individual com a Consciência coletiva e ainda unir a Consciência do
coletivo com a Consciência do Absoluto.
A Consciência coletiva é consciência em estado ativo e em estado
manifestado: além desse estado manifestado tem que se tentar unir à uma
consciência não-manifestada, que é a Consciência do Céu Anterior.
De qualquer maneira, a grande meta é unir uma luz com dez mil
luzes, unir uma luz com todas as luzes.
Quando a luz daquela lanterna une-se às luzes do salão repleto de luzes,
não mais existe a luz individual e sim a luz coletiva. Ao mesmo tempo, essa luz coletiva faz parte
da luz individual. A partir do momento
em que nossa Consciência consegue se fundir com a Consciência Universal, a consciência
Universal passa a ser nossa Consciência.
Isso é que faz com que nossa consciência se expanda. Também isso é que faz com o mestre espiritual
possa compreender mais do que uma pessoa normal, iluminando mais do que uma
simples lanterna ilumina. Apesar do
corpo da lanterna, o mestre espiritual ilumina como um holofote. Esse é exatamente o significado do aumento da
Consciência. por isso, Ele diz: “Harmonizando-se à luz, igualando-se à poeira.”
Igualando-se à poeira - Significa abraçar todas as coisas dentro de si. Imaginemos uma cena: domingo, cinco horas da tarde, a luz fria do
inverno entrando pela janela de sua casa.
Você vê aquela luz que entra pela janela dentro do de um corredor mais
escuro e percebe milhares de pontinhos de poeira flutuando... Se você imaginar que cada pontinho desses é
um universo, um planeta, uma galáxia, pode compreender então que dentro dessa
luz existem milhares de seres, milhares de vidas, como partículas. A partir do momento que a nossa consciência
consegue se unir com a Consciência que abraça todas as coisas - que é a própria
Consciência do Tao -, tudo o que existe no universo e o próprio universo se
tornam infinitos pontinhos de poeira dentro de nós.
Qual é a diferença entre o Iluminado e o não-iluminado?
O não-iluminado tem a consciência dentro do corpo e o Iluminado tem
o corpo dentro da Consciência.
Normalmente, sentimos que estamos dentro do nosso corpo e não
conseguimos ter a consciência daquilo que está fóra de nós. Parece então que a consciência vem de dentro
para fora e começa-se a compreender coisas de dentro para fora. Isso é uma pessoa comum.
Uma pessoa iluminada tem a consciência fora de seu corpo. Não apenas de seu próprio corpo como também
fora de todos os corpos que existem. A
partir daí, esta pessoa abraça todos os seres dentro de si feito os milhares
pontinhos de luz, de poeirinha, dentro de um mundo de luz. Esse é o sentimento e o estado de quem está
Iluminado. Dentre esses milhões de
pontinhos que existem dentro dessa luz, muitos pontinhos podem significar os
antigos corpos ou mesmo o corpo atual que ainda permanece, dessa pessoa que
atingiu a Iluminação.
No entanto, tudo muda, aquela poeirinha desaparece dando lugar à
outra poeirinha, porém a Consciência permanece.
Esse é o estado da Imortalidade.
Imortalidade não é apegar-se radicalmente a esse corpo de carne e não
deixá-lo transformar-se. Imortalidade é
uma Consciência que permanece e então, o corpo transforma-se, naturalmente.
Em seguida, Lao Tse faz uma determinação de como seria esse estado
de Imortalidade. Esse estado de
Consciência e de Vida Infinitas é
Límpido como a existência
eterna
Límpido quer dizer transparente. No
conceito da teologia Taoísta, o Sublime, o Absoluto, é simbolizado por três
divindades chamadas de ‘Tríplice Transparência' ou seja, três vezes
transparentes. Alguns tradutores
costumam traduzir por Três Purezas, pois esta palavra pode significar pureza ou
transparência. Normalmente, optamos pela
palavra Transparência porque ela é mais neutra, enquanto ‘pureza’ pode incorrer
num julgamento meio perigoso de ser identificada esta palavra como uma espécie
de moralismo que julga as coisas, o que
criaria uma interpretação distorcida.
Tríplice Transparência ou Tríplice Absoluto é representado no Taoísmo
por divindades simbolicamente chamadas de O Sublime Senhor do Princípio
Inicial, o Sublime Senhor do Tesouro do Espírito e o Sublime Senhor do Caminho
e da Virtude.
O primeiro deles é aquele que representa o próprio Tao, o Tao como
ele é. O segundo, representa a Sagrada
Leitura, os ensinamentos revelados. O
terceiro, representa o Mestre, a linhagem dos mestres tradicionais que vêm
desde os tempos imemoriais, linhagem nunca interrompida.
O trabalho do Taoísmo tradicional apóia-se em três pontos.
Quando uma pessoa segue o Tao, é Taoísta, deve estudar a Sagrada
leitura, deve usar a Sagrada Leitura como base de referência. Sagrada Leitura não é qualquer texto.
Existem dois tipos de Sagrada Leitura: livros escritos por mestres
ascensionados, que existiram historicamente e deixaram tratados para nós - como
no caso do Tao Te Ching que estamos estudando.
O Tao Te Ching foi escrito por Lao Tse, que ascensionou e deixou o livro
para nós. Isso é a Sagrada Leitura.
Ou são textos revelados por mestres iluminados que, através a
incondicional Consciência, foram capazes de contemplar ou extrair do fundo do
universo tais conhecimentos.
Existe em nosso universo uma espécie de biblioteca de conhecimentos
- os mestres extraem do fundo do universo conhecimentos que estão lá guardados
por infinitos tempos e nos revelam através dos textos chamados de Textos de
Revelação. Esses textos são revelados
apenas por grandes mestres iluminados que não se colocam como donos ou autores
dos mesmos.
No Taoísmo, temos, portanto, dois tipos de textos sagrados, ambos
sendo revelados pelos grandes mestres iluminados: os textos assumidos como autoria própria e os textos não assumidos
como autoria própria e sim como extração dos conhecimentos do fundo do
universo. São textos escritos e textos
de revelação.
Esses textos são reconhecidos como sagrados porque as pessoas que
os revelaram e passaram, alcançaram a iluminação e ascensionaram. Apenas reconhecemos o texto sagrado quando
ele é herança de um grande mestre, historicamente comprovado. O Tao Te Ching é de autoria de Lao Tse porém
existem outros textos deixados por ele onde ele acentuou o fato de que não eram
obra sua, que ele estava apenas repassando o conhecimento para nós da maneira
como o recebeu. Esses foram textos de
revelação. Também existem textos de
revelação vindos diretamente das divindades superiores que não encarnaram na
Terra. Esses textos só são recebidos
diretamente por mestres de níveis bem altos e que possuem obras de autoria
própria como também revelam outros textos.
O Taoísta, para entender o Tao intuitivamente, busca esse Tao
tentando vivê-lo e entendê-lo através desses textos ou através dos
conhecimentos de um mestre, uma pessoa vida, presente.
Por que a importância de um mestre? Por que é necessário ter um
mestre ou ir em busca de um?
Porque os Mestres são aquelas pessoas vivas que realizaram ou estão
realizando a condição ou estado do Tao.
É fundamental que se encontre uma pessoa que realize em sua própria
pessoa física esse nível do Tao - porque assim torna-se possível par anos a
nossa realização pessoal. Alguém que
seja comum como qualquer um de nós, que tenha os problemas do dia-a-dia que
todos temos e que, através de uma série de práticas espirituais, conseguiu se
transformar. Sendo assim, por
experiência própria, ele pode passar técnicas e informações par anos quando
surgirem os primeiros fenômenos de transformação em nosso corpo e em nossa
mente.
No entanto, é preciso que estejamos atentos ao fato de que não
estamos seguindo um guru - às vezes se encontram pessoas carismáticas -, que
não tem nada a ver com o Tao ou com o que já foi falado e comprovado pelos
mestres anteriores. Por isso, nós
utilizamos sempre a Sagrada Leitura para medir até que ponto esse mestre é
autêntico. Meu Mestre Maa sempre me diz
para se observar o que o mestre diz e faz e se está contradizendo ou não o que
todos os mestres iluminados falaram ou fizeram.
Uma pessoa pode buscar o Tao sem leitura e sem mestre. É um pouco difícil, mas não é
impossível. É como se essa pessoa
desdenhasse a invenção dos carros e, de repente, olhasse para
uma roda de madeira e começasse a inventar um automóvel a partir do
nada. Essa pessoa pode até ser
bem-sucedida em inventar um carro excelente apenas que isso vai levar
aproximadamente uns quinhentos ou seiscentos anos até ela alcançar o que os
outros já alcançaram.
É, portanto, fundamental que não se anulem os documentos deixados e
as experiências dos mestres, senão estaríamos começando do nada. Principalmente para o Taoísmo, que remonta a
mais de sete mil anos de experiência acumulada.
Partir do nada pode ser interessante mas o caminho fica muito longo e
como a nossa vida não é tão longa para se fazer esse caminho de sete mil anos
todo de uma vez, é importante se ter em conta estes três fundamentos.
Dessa maneira, o Taoísmo usa o conceito da Transparência para
representar o Absoluto. Esse Absoluto é
fundamental para essas três metodologias: do Tao, da Sagrada Leitura e dos
Mestres.
Capítulo 4
O Caminho é um Vazio
E seu uso jamais o esgota
É imensuravelmente profundo e
amplo,
como a raiz dos dez mil seres.
Cegando-se o corte
Desatando-se o nó
Harmonizando-se à luz
Igualando-se à poeira
Límpido como a existência
eterna
Não sei de quem sou filho
Venho de antes do Rei Celeste.
Este texto é extraído da
transcrição da gravação da Aula ministrada por Wu Jyh Cherng, em 14 de
junho de 1994, sobre o Capítulo 4 do Tao
Te Ching, o Livro do Caminho e da Virtude, de Lao Tse - com Tradução e
Interpretação do Mestre Cherng.
Esta Aula foi transcrita e
sintetizada por Janine Milward e o Título deste texto
Quatro Tarefas para Alcançarmos a Imortalidade
foi idealizado por Janine e não faz parte do
texto original.
A foto é de Janine e retrata
o Ashram do Sítio das Estrelas.
A tradução dos Capítulos do
Tao Te Ching foi realizada por Wu Jyh Cherng,
do chinês para o português,
e foi primeiramente publicada pela Editora
Ursa Maior,
sendo hoje publicada pela Editora Mauad, São Paulo,
Brasil
Na Editora Mauad, São Paulo, Brasil,
encontra-se ainda no prelo a
realização da publicação, em breve,
das interpretações de Wu Jyh
Cherng
acerca os 81 Capítulos da obra máxima de Lao
Tse, o Tao Te Ching