Alguns Comentários sobre Ting, o Caldeirão, Fogo sobre Vento, e Ching, o Poço, Água sobre Vento



Alguns Comentários sobre
Ting, o Caldeirão, Fogo sobre Vento,
e
Ching, o Poço, Água sobre Vento

Janine Milward


 A realidade intrínseca no Poço e no Caldeirão é que ambos possuem o Vazio - assim como o Homem Sagrado.  Sendo assim, podem todos sempre estar doando a vida e o alimento de maneira infinita e iluminada.

Tanto o Poço, Ching, quanto o Caldeirão, Ting, são Hexagramas que ‘materializam algo”.  Algo que é manufaturado, construído, através as mãos do homem.   Estes Hexagramas são os dois únicos que trazem as Imagens de utensílio e de construção realizados pelo Homem.

No entanto, em o Poço, Ching, vemos que sua grande Virtude é que sempre ele estará lá, em seu mesmo lugar, o lugar onde a água pode ser encontrada e trazida até os seres.  Todos vivem em torno a um poço. 

Com o Caldeirão, Ting, é diferente: o utensílio pode ser encontrado em cada uma das casas dos homens.

Doação de Água e doação de Alimento: a Vida agradece - assim são O Poço, Ching, e O Caldeirão, Ting.

Em Ching, o Poço, existe o tom de toda uma Comunidade se enraizar em torno a um Poço – onde a água da vida é colhida.  Tudo parte do Poço e vai em direção à Comunidade, quer dizer, à cada núcleo familiar que se situa em torno ao Poço.

Em Ting, o Caldeirão, existe o tom de cada núcleo familiar se voltar para a realização da alimentação dos seres pertencentes a este núcleo e aos seus convidados bem como do oferecimento de alimentos aos deuses, como oferenda e como pedido de proteção.  Tudo parte do Caldeirão pertencente a um núcleo familiar e vai em direção à Comunidade.

No Poço, em sentido mais elevado, encontra-se o Mestre doando sua Sabedoria a todos aqueles que O procuram.  No Caldeirão, em sentido mais elevado, encontra-se o Mestre trabalhando seu corpo físico em busca de seu Caminho de Iluminação e de Imortalidade/Liberação.

Tudo aquilo que primordialmente advém de O Poço, acaba sendo espraiado ao mundo e a todos os seres através O Caldeirão.

Ambos os Hexagramas demonstram como o homem superior pode sair ao encalço de seu Tao e se tornar um ser iluminado: dando de beber a si mesmo  e ao mesmo tempo, doando essa mesma água para quem quiser vir buscar (tendo a Água de O Poço o Atributo de Sabedoria); e cozinhando o alimento para si mesmo, dentro do Caldeirão que o acondiciona, ao mesmo tempo que doando este alimento a quem queira vir buscar (porque o Fogo sempre aceso e aderido à Madeira e soprado pelo Vento tratam de sempre estarem realizando a Virtude da Transmutação).

O Poço e o Caldeirão são Hexagramas que falam de tudo aquilo que é necessário aos seres para que estes possam realizarem-se enquanto seres viventes fisicamente e enquanto seres buscando suas realizações espirituais.


Ambos os Hexagramas anuncia-se a necessidade de limpeza dessas realizações e esta acontece através as Linhas ascensionais trazendo a culminância da limpeza e o pronto uso do Caldeirão e do Poço nas Linhas Quinta e Sexta:

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Ting, o Caldeirão         Ching, o Poço


Em Ting, o Caldeirão, o Vento acolhe o Fogo;
em Ching, o Poço, o Vento acolhe a Água.

É interessante percebermos que Fogo e Água - os herdeiros diretos de Ch'ien, o Céu, e de K'un, a Terra - tomam parte, enquanto Trigramas do Céu, Trigramas Visitantes, dos dois únicos Hexagramas que imajam utensílio e construção realizada pelo Homem. 

O Fogo é a Consciência e a Água é a Sabedoria, são os Conhecimentos, e fazem parte do Trigrama do Céu, o Trigrama Superior que é estruturado pelo Trigrama da Terra e realizado por Sun, o Vento, a Madeira, aquela que realiza o encontro entre Céu e Terra e que também faz a vida na Terra acontecer através os seres que aqui são acolhidos.

Sun, a Filha mais Velha, o Penetrante, enquanto Madeira, possui movimentação tanto ascendente quanto descendente, ou seja, a Madeira cresce para o alto, é a Árvore..., no entanto, antes disso, esta madeira cresceu para baixo, tornando-se as Raízes, penetrando profundamente na Terra.

Sun, a Filha mais Velha, enquanto Vento, a Suavidade, tem movimento tanto ascendente quanto descendente... porém podemos vê-la atuando mais e mais seu rodopio, seu buscar alçar vôo suave da Terra para o Céu, indo a todos os cantos, espraiando-se mundo afora e mundo adentro.

Sun, a Filha mais Velha, enquanto Madeira é a Semente que se tornará Raízes e que tudo isso se tornará a Árvore.  Esse Crescimento pode acontecer tanto de forma a realizar seus Atributos de Penetrante quanto de Suavidade.  Sun, a Filha mais Velha, enquanto Vento é aquele, inefável e sutil, que carrega consigo a Semente que é espraiada para todos os lugares.  Sun, o Vento, semeia a Terra, em sua Suavidade e faz com que a Terra receba as Sementes e que estas sejam transmutadas em Raízes, em suas Penetrações.

K'un, a Terra, a Mãe, o Receptivo, tem como maior Virtude a Humildade, a Modéstia.  Por esta razão, ‘em se plantando, tudo dá’, ou seja, a Terra é profícua em realizar a Vida que nela é colocada enquanto Semente a ser transmutada em Raízes que se crescerão e que se apresentarão ao mundo enquanto Árvores ofertando flores e frutos, ofertando o Apogeu do Ciclo da Vida.  Ao mesmo tempo, sempre K'un, a Terra, a Mãe, estará trazendo para seu Ventre abnegado e abrangente, o Recolhimento e a Preservação das Sementes que Restaram de forma que estas possam dar continuidade ao infinito ciclo da Vida.


 
Em Ting, o Caldeirão, e em Ching, o Poço, estaremos encontrando a ação do Fogo para cozinhar o alimento dos homens e dos deuses e a bênção da Água para saciar a sede dos homens e de todos os seres.   E Sun, a vegetação do Planeta Terra vem acolher a Água bendita que cai do Céu e que realiza na Terra seu ciclo e vem também fazer o Fogo, o Aderir, acontecer, quer dizer, aderindo à Madeira.  Ou seja, sem a Madeira, Sun, tanto a Água correria sem entranhar-se na Terra, buscando rios e o oceano quanto o Fogo não poderia acontecer por não ter onde Aderir.  E vemos que Sun, a Madeira e o Vento, atua na natureza nos proporcionando nosso alimento, enquanto Madeira, e nos proporcionando nosso entrelaçamento de comunicação entre os seres, enquanto Vento.

Este alimento e esta água são também compreendidos enquanto elevação de consciência e sabedoria doada a todos aqueles que se utilizam de Ting, o Caldeirão, e de Ching, o Poço.


Em Ting, o Caldeirão, existe o Fogo e a Madeira e o Vento, fazendo com que este Fogo realize a transmutação dos alimentos que serão servidos aos seres e aos deuses em utensílios próprios para tanto. 

 O Tao de O Caldeirão é a saciação da fome dos seres.

O Tao da Água, K’an, é ser a Essência da Vida.  Sendo a Essência, possui a Sabedoria.  Em Ching, o Poço, o Tao de Sun, o Vento, a Raíz, a Madeira, é o de recolher esta Essência da Vida, esta Sabedoria, armazená-la e doá-la a todos os seres. 

Tao de O Poço é a saciação da sede dos seres.

Em bem se prestando atenção ao Trigrama da Terra, podemos visualizar os pés do Caldeirão e seu bojo, o lugar do Vazio que acolhe o cozimento e, no Trigrama do Céu, podemos ver as alças do Caldeirão!  Este é o Caldeirão, Ting, realizado através sua Imagem desenhada em suas Linhas.

A Água, K’an, cai constantemente dos céus em seu ciclo duradouro da Roda da Vida.  Esta Água cai na Terra e entranha-se nas raízes da Madeira, Sun.  As raízes guardam consigo a água da chuva que penetra sob a terra, deixando escorrer essa água, docemente, suavemente, formando nascentes, minas, poços, lençóis d’água.  Este é o Poço, Ching, realizado através o entrelaçamento da Água com a Madeira.

Encontraremos as Linhas do Caldeirão, Ting, apresentando um imenso movimento de baixo para cima - na limpeza do Caldeirão - de forma que as duas últimas Linhas mostrem a plenitude total das Virtudes do Caldeirão, ou seja, a Transmutação, em nível mais elevado espiritualmente, e o alimento pronto para ser servido, em nível mais comum da vida.

Quando o Poço, Ching, não serve mais em suas águas para ser usado, é preciso que seja recuperado.  Esta recuperação se dá de baixo para cima, e isso é demonstrado através cada Linha do Hexagrama, que atuam como tijolos formando anéis, um sobre o outro.  De anel em anel, de Linha a Linha, o Poço vai sendo restaurado até que todas as Linhas sejam realizadas, até que a água do Poço volte novamente a ser usada e a servir a todos os seres.

Pode-se mudar uma cidade mas não se pode mudar um poço” - diz o I Ching.


A realidade intrínseca no Poço e no Caldeirão é que ambos possuem o Vazio - assim como o Homem Sagrado.  Sendo assim, podem todos sempre estar doando a vida e o alimento de maneira infinita e iluminada.

COM UM ABRAÇO ESTRELADO,
JANINE MILWARD


Créditos:

Trecho extraído do Quinto Volume de O Fio da Meada
– Os Hexagramas compostos pelo Vento – Ching, o Poço, e Ting, O Caldeirão
O FIO DA MEADA
I Ching do Caminho do Céu
Janine Milward
© 1997 - Edição Revisada © 2010
Editora Estrela do Belém

O I Ching, O Livro das Mutações
Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários de Richard Wilhelm
Tradução para o português de Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Correa Pinto
Editora Pensamento – São Paulo, Brasil